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terça-feira, 8 de agosto de 2017

Os Panteras Negras e a Liberdade de Rafael Braga

Há 4 anos, Rafael Braga tem sido vítima da política anti-negro do Estado brasileiro de encarceramento em massa. Durante esse período houveram várias mobilizações, diversos setores negros vêm se organizando para garantir que essa história não seja esquecida e que de uma vez por todas a Justiça racista tire as mãos de nosso irmão Rafael.
 A partir de reivindicar as iniciativas corretas dos setores que se colocam em defesa desse jovem, gostaríamos de retomar alguns elementos da tradição dos negros norte-americanos, a partir das experiencias do Partido dos Panteras Negras, para auxiliar na reflexão de como defender nossos presos políticos. A experiencia desses irmãos pode nos abrir os olhos não só para a defesa de Rafael Braga, mas para a luta em defesa dos milhares de negros que estão ou serão encarcerados pela política anti-negra de encarceramento em massa.
As lutas em defesa da liberdade dos militantes do Partido dos Panteras Negras começaram a partir da campanha nacional, encabeçada pela organização, pela liberdade de seu fundador e dirigente Huey Newton. Huey foi acusado por homicídio de um policial em uma abordagem em outubro de 1967. Enfrentaria a penalidade máxima da morte na câmara de gás.
A organização entendeu que a liberdade de Huey deveria ser tomada como uma questão central, merecendo dedicação e força total de todo o partido. Esse julgamento não se tratava de um processo legal, mas de uma disputa política, se tratava da luta contra o Estado racista. Huey era um aviso aos que desejavam se levantar, e ao mesmo tempo, um ataque mortal aos negros que já estavam em luta.
Os Panteras viam o sistema político norte-americano como inerentemente injusto e anti-negro. Entendiam que a situação dos negros no país se assemelhava com a dos países colonizados (ou como chamavam, do Terceiro Mundo) e que a polícia norte-americana cumpria o papel opressor do exército estrangeiro. Nesse sentido, era preciso se livrar da opressão do imperialismo e resistir à sua estrutura racista.
As mortes e as prisões de afro-americanos eram crimes políticos, crimes de guerra. E a partir dessa visão o Partido entendeu que “apenas uma poderosa campanha política de massas poderia salvar a vida de Huey” (Black Against Empire). Era o momento de colocar o Estado no banco dos réus. A tática de defesa foi o ataque: “o partido reverteu as acusações do estado contra Newton, usando o caso para mobilizar o apoio e colocar os EUA em julgamento” (Black Against Empire).
A brutal mobilização em torno da campanha “Free Huey!” proporcionou tamanha pressão social, que obrigou a Justiça norte-americana à libertar Huey em 1970. Essa luta, mostrou aos próprios Panteras sua força política e os ensinou como defender seus militantes.
Uns dos gritos que ecoam em São Paulo pela liberdade de Rafael Braga é: “Rafael Braga, tem mais de mil...Tem que acabar com a polícia/PM/cadeia no Brasil”.
Essas palavras trazem de fundo parte essencial da ideia que levou os Panteras à arrebatadora campanha em defesa de Huey. O Estado brasileiro é estruturalmente racista, e há anos tem organizado um verdadeiro massacre de negros, a partir da morte pelas mãos da polícia ou pelo encarceramento em massa. E não por coincidência uma das principais justificativas é a “guerra às drogas” e a “criminalidade”.
Rafael, hoje, responde por tráfico de drogas, Huey respondeu pela morte de um policial. A tática de criminalizar a negritude para poder cometer as mais brutais atrocidades não é exclusividade do imperialismo norte-americano. A Justiça e os supremacistas brancos farão questão de mencionar nossos presos como criminosos, assassinos e traficantes. Não permitem e nem permitirão se quer o direito à dúvida, da defesa, não precisam provar a culpa de quem acusam, simplesmente acusam e a opinião pública acata.
Nós, por outro lado diremos: Asses são nossos presos políticos! Defenderemos sua liberdade até o fim! Não acreditamos nessa Justiça, pois não há justiça para os negros em um país estruturalmente racista. Eles são prisioneiros e mortos de guerra, ou melhor, de um massacre onde apenas o lado opressor possui poder bélico. Sabemos o óbvio, que estamos lidando com um Estado que permite à elite branca o lucro da venda às drogas e também a possibilidade de usufruir das drogas de melhor qualidade. Mas agora não estamos discutindo isso.
Nesse sentido, os Panteras Negras faziam questão de reiterar que: “O estado imperial americano opressivo negou aos negros poder político e econômico por isso, os negros não tinham a obrigação moral de obedecer às leis, eles tinham a obrigação moral de resistir” (Black Against Empire). As leis dessa democracia são anti-negras, os julgamentos dessa democracia também. Esse entendimento se expressou na demanda de julgamento de crimes cometidos por negros e contra negros por um júri negro, levantado nos 10 Pontos do partido.
A defesa de nossos presos, é parte central da luta contra o racismo. Devemos entender que todos os negros presos são presos políticos. A defesa de Rafael Braga deve ser apenas o aviso de que não permitiremos mais nenhum desses crimes, que defenderemos todos os nossos irmãos. Mais do que isso, deve ser a prova concreta de que lutaremos, assim como Zumbi e outros palmarinos até a nossa morte contra o racismo e a exploração.
Os Panteras também nos deixaram outras importantes lições. Passavam por um momento de mobilizações da juventude contra a guerra do Vietnã. Nesses processos de luta, a juventude branca de classe média teve algumas experiencias com a repressão, sentiram uma pequena amostra do peso da violência policial. O partido aproveitou o momento político para sensibilizar esse setor social, tornando a defesa de Huey o fio condutor da esquerda anti-imperialista. Era preciso massificar a campanha, mas mais do que isso, eles entendiam que existia um inimigo comum e como setor que se educava para ser a vanguarda revolucionária, acreditavam ser necessário unificar fileiras, em uma grande frente única contra o imperialismo norte-americano e seus crimes de guerra, dentro e fora dos EUA.
A primeira unidade do partido foi com uma organização chamada Partido Paz e Liberdade, sua principal atuação era na luta anti-guerra. Os Panteras tiveram de convencer esses jovens brancos de que não existia a possibilidade de garantir um julgamento justo para Huey, sendo assim, a única justiça possível seria sua liberdade. A principal contribuição da organização para a campanha de Huey veio a partir da colaboração financeira e da disponibilização dos materiais para os atos e falas públicas.
Um grande exemplo para a esquerda socialista, movimento estudantil e sindicatos no Brasil de como auxiliar na luta pela liberdade de Rafael Braga. Vejam, eles levavam o microfone para os Panteras falarem, não o tomavam no meio do ato. Não tentaram apagar a direção reconhecida pelos negros para poder dirigir o movimento, mas se uniram a esses valiosos protagonistas negros e aprenderam com eles.
Essa foi apenas uma das inúmeras alianças dos Panteras, em fotos históricas das mobilizações pela liberdade de Huey é possível perceber a presença de grupos de asiáticos, porto riquenhos e etc., muitos deles profundamente influenciados e auxiliados pelos Panteras.
Além de alianças com organizações, a campanha contou com o apoio de intelectuais e artistas importantes da época. Todo o poder e toda a força do Partido foi utilizada para garantir a liberdade de Huey, nenhum esforço foi poupado. E assim foram também as inúmeras campanhas pela liberdade dos militantes presos, as denúncias dos assassinatos policiais e dos ataques recorrentes.
Hoje, infelizmente, não temos uma organização que possa cumprir o papel fundamental que cumpriu o Partido dos Panteras Negras. Mas a iniciativa de alguns setores do movimento negro e de militantes negros tem feito com que a campanha pela Liberdade de Rafael Braga cumpra um importante papel na luta negra. A liberdade de Rafael depende exclusivamente da força política desse movimento, já que a Justiça não fará mais do que cumprir o seu papel de capataz dos modernos senhores de engenho.
Por isso, hoje, as lições das campanhas pela liberdade dos militantes do Partido do Panteras Negras se tornam tão necessárias. Só uma campanha de massas pode libertar Rafael Braga, é preciso unificar todas as nossas forças na defesa desse irmão. A luta é a única saída, e dela não desistiremos, assim como fizeram nossos irmãos que tombaram lutando liberdade e justiça.



Marcela de Palmares e Fabio Nunes.

terça-feira, 1 de agosto de 2017

Rafael Braga e a Esquerda Brasileira.


Ontem, 31 de julho, aconteceram em algumas cidades do país atos/vigílias pela liberdade de Rafael Braga. A mobilização teve como intenção pressionar politicamente o Judiciário para que o pedido de habeas corpus fosse concedido ao jovem negro, no julgamento realizado hoje (1 de agosto), o que possibilitaria a ele responder seu processo em liberdade.
Em São Paulo, a manifestação se concentrou por volta das 18hs em frente ao Teatro Municipal caminhando pelas ruas da região central, exigindo a liberdade de Rafael Braga, o fim do encarceramento em massa e do genocídio da população negra e pobre. Esse ato foi organizado por setores do movimento negro que tem se articulado a partir de campanhas por Rafael Braga como, por exemplo, “30 dias por Rafael Braga”. O ato foi composto centralmente por setores negros independentes e setores do movimento negro, a participação da esquerda que se reivindica socialista foi irrisória. 
Nesse texto, gostaríamos de nos aprofundar nos elementos que levam a essa expressão tão pequena da esquerda numa luta tão importante e emblemática. Enquanto militantes negros revolucionários, acreditamos que só um balanço duro e sincero pode nos levar à construção de uma política verdadeiramente revolucionária que se funda às necessidades e a luta dos negros em nosso país. Enxergando o verdadeiro papel dos setores negros na vanguarda da classe operária assim como a importância da luta negra independente.
Rafael Braga, hoje se coloca como o único preso político de um período reivindicado pela esquerda como o marco de uma mudança na conjuntura política do país. Fruto dos grandes levantes populares, foi uma escolha política quase perfeita da burguesia racista.
A prisão desse jovem significa uma clara demarcação da resposta que as classes dominantes e o Estado brasileiro preparam para o momento de ascensão da luta operária e popular. Ela não vem sozinha, vem com iniciativas como a da redução da maioridade penal, a retomada de discussões como as leis anti-terroristas, as UPPs, a militarização das favelas, morros e periferias, assim como um processo de aprofundamento das políticas higienistas e manicomiais em várias capitais. Um claro ataque racista.
Milhares de jovens negros são presos cotidianamente a partir da política de Estado de encarceramento em massa, além destes, outros milhares são mortos a partir da política genocida desse mesmo Estado. O que diferencia Rafael destes jovens é o fato dele ter sido preso pela acusação de um crime de “terrorismo” (suposto porte de artefatos explosivos). Essa relação por um lado torna esse jovem um preso político das manifestações contra a Copa do Mundo, por outro, impõe a reflexão para os movimentos sociais e as organizações de esquerda sobre a questão carcerária, a violência policial e os demais problemas enfrentados cotidianamente pelos negros.
Esse caso deve ser visto como uma tentativa de estabelecer antecedentes na consciência coletiva que permitam que outros ataques sejam desferidos no conjunto dos trabalhadores e centralmente nos setores mais oprimidos e explorados, os negros e negras. Esse processo se alicerça na ideologia hegemônica racista na qual a prisão de um homem negro é naturalizada, pois se trata de um setor visto como “suspeito”. 
Ao articular a sua trama racista o Judiciário e o braço armado do Estado não para por ai, para sustentar a criminalização desse jovem, como símbolo da criminalização dos movimentos sociais e da luta, a polícia relacionou a sua prisão primeiramente à “ações terroristas”. Isso se deu no momento político em que setores mais conservadores se colocavam contra as alas mais radicalizadas dos protestos, denominadas “baderneiros”. 
O caso, assim como a luta pela liberdade de Rafael repercutiu nacionalmente, influenciando setores da opinião pública e contestando toda a teoria da polícia. A prisão de um jovem negro por portar produtos de limpeza desmoralizou a ação dos juízes e da polícia, ao mesmo tempo abriu espaço para a discussão da criminalização dos setores pobres e negros da população.
A partir dessa desmoralização, foi preciso ir mais longe, ligando Rafael ao tráfico de drogas. Nesse momento, mais uma vez, a “guerra às drogas” mostra a sua verdadeira face racista. São os jovens negros, pobres e periféricos as maiores vítimas de um massacre em nome de um falso combate às drogas. Num país estruturalmente racista a prisão de um jovem negro por tráfico de drogas é naturalizada. É a partir dessa política que a repressão tenta transformar Rafael, um preso político em um “criminoso comum”.
E como se comporta a esquerda a partir dessa realidade?
Os setores da esquerda socialista têm levado a campanha pela liberdade de Rafael Braga, quando muito, como uma simples tarefa corriqueira. Assim, como trata o conjunto das pautas e demandas essencialmente negras, a defesa de Rafael aparece como uma categoria de segunda importância.
A origem desse racismo é profunda e antiga, retoma aos primórdios da construção das organizações de esquerda no país. E pode ser vista a partir do papel reacionário de se colocar contra as demandas negras, que cumpriu o Partido Comunista, virando as costas para os negros, restando como “única opção” de aliança o integralismo.
 O que hoje nos salta aos olhos, é uma clara adaptação à tese racista do Mito da Democracia Racial, por via da qual os elementos raciais são negados e excluídos, formando uma análise “sem raça” da realidade, o que leva a fortificação do racismo entre as fileiras ditas revolucionárias e ao afastamento dos setores negros que desejam lutar pela transformação da realidade.
Como militantes revolucionários, fazemos coro com os irmãos e camaradas negros que nos antecederam e que provaram que a questão de raça e classe são um par dialético inseparável. Isso, pela negativa, pode ser comprovado a partir da defesa envergonhada que esses setores (esquerda socialista) têm feito de Rafael Braga. Nela o racismo se mistura a uma política “inconsequente” que deixa para traz os presos políticos. Deixando também um rastro sombrio para o futuro da luta de classes e da luta por uma vida digna da população negra.
Poderia ser diferente.
Hoje, apesar de muito pequena a esquerda socialista possue certa influência em setores da classe operária e também de movimentos sociais. É responsabilidade do conjunto dos lutadores se colocar na defesa incondicional da liberdade de Rafael Braga. Para isso seria preciso que os partidos e as organizações de esquerda levantassem campanhas reais e de base que organizassem os trabalhadores, juventude e etc. para lutarem com as ferramentas construídas historicamente pelos trabalhadores por seus presos políticos.
A partir de atos, greves, paralisações, piquetes e etc. seria possível impor essa derrota à classe dominante, moralizando os que lutam e construindo junto ao movimento negro e aos negros que desejam se levantar contra o racismo uma perspectiva militante onde a esquerda revolucionária se torna um forte aliado. 
A partir de nossas pequenas forças, panfletamos e discutimos com trabalhadores em fábricas sobre a necessidade de que a paralisação de 30 de junho levasse enquanto exigência dos trabalhadores do país a Liberdade imediata de Rafael Braga. Essa pequena ação é uma expressão, fruto de nossos balanços, de como acreditamos que os revolucionários devem atuar.
A relação entre raça e classe não pode ser apenas tema de falas calorosas em dias de “calendário de luta”. Se trata da validade, da vitalidade e da justeza de uma saída revolucionária em nosso país. Quando falamos que a revolução será negra ou não será, estamos também dizendo que uma organização que não é capaz de pensar a questão negra no país, que não dê provas concretas de que é capaz de avançar em direção aos setores mais oprimidos da classe trabalhadora está na contramão da construção de um partido revolucionário no Brasil. Seu destino é continuar sendo composta por pequenos grupos brancos de classe média. Um caminho certo para o fracasso.

Ass. Marcela de Palmares, Nat Zhamora e Fábio Nunes.

sábado, 15 de abril de 2017

Introdução aos documento da SWP sobre a questão negra - George Breitman

de: https://www.marxists.org/archive/trotsky/works/1940/negro1.htm#breitman

1962 - Introdução por George Breitman.

Esta coleção de discussões, relatórios e resoluções intencionado à ajudar aqueles que querem seriamente a estudar a história do desenvolvimento da análise socialista revolucionária e o programa para a luta dos negros nos Estados Unidos. Ela reúne alguns documentos-chave do período entre 1933 e 1950, que são escassos e fora de catálogo, e fornece a base para a compreensão de material mais recente (1954-1961) que está listado no final desta coleção.

Em seu livro, Os Primeiros Dez Anos do Comunismo Americano, James P. Cannon mostra o impacto saudável que a revolução russa teve na a política do movimento radical americano sobre a luta dos negros, especialmente no Partido Comunista jovem. Até então, Cannon dizia que os radicais americanos "não tinha nada para começar com a questão negra, só uma teoria inadequada, uma atitude falsa ou indiferente e a aderência de alguns negros individuais de inclinação radical ou revolucionária." A teoria inadequada, a partir do qual a atitude e falta de influência seguiram, foi a de que a questão negra era pura e simplesmente "um problema econômico, parte da luta entre os trabalhadores e os capitalistas; nada poderia ser feito sobre os problemas específicos de discriminação e desigualdade neste lado do socialismo" Mas graças ao exemplo e a pressão dos revolucionários russos, os comunistas americanos acabaram aprendendo "lenta e dolorosamente "a" mudar a sua atitude; para assimilar a nova teoria da questão negra como uma questão especial de cidadãos de segunda classe duplamente exploradas, exigia um programa de reivindicações especiais como parte do programa geral e começaram a fazer algo sobre isso ". (Originalmente impresso no Internacional Socialist Review, Verão, 1959.)

Parte do que pensamos e fazemos sobre a luta dos negros hoje pode ser atribuída a essas influências positivas dos bolcheviques russos, porque os fundadores do Partido Socialista dos Trabalhadores estavam entre os líderes do Partido Comunista, até serem expulsos em 1928 por se aliar com Oposição de Esquerda contra a burocracia estalinista da Internacional Comunista. Através destes fundadores, são parte de nossa herança da teoria e da prática revolucionária.

Além disso, a tendência que eventualmente se tornou o Partido Socialista dos Trabalhadores também teve o benefício de consulta e aconselhamento de Leon Trotsky, líder da Oposição de Esquerda, de 1929 até sua morte, em 1940. Esta foi uma segunda grande influência "fora" no SWP para pensar sobre a luta dos negros.

Antes de falar sobre as contribuições de Trotsky incluídas nesta coleção, gostaria de citar algumas coisas anteriores. Trotsky foi um grande líder e teórico marxista - colaborador mais próximo de Lenin na revolução russa e fundador da Quarta Internacional em 1938. Mas ele não foi capaz, até os últimos anos de sua vida, quando recebeu asilo no México (1937-1940) , de adquirir conhecimento detalhado ou o contato próximo com os problemas e desenvolvimento dos Estados Unidos, incluindo a luta dos negros. A seguir estão três passagens iniciais de seus artigos e cartas.

Em 1923, Trotsky escreveu uma carta respondendo a certas perguntas feitas a ele pelo poeta revolucionário Negro, Claude McKay. Ele apareceu pela primeira vez no International Press Correspondence e pode ser encontrada em: Trotski os primeiros cinco anos da Internacional Comunista, Vol. 1. Aqui, pela primeira de muitas vezes, Trotsky coloca uma pesada preocupação sobre os preconceitos raciais da burocracia operária e dos trabalhadores brancos atrasados, sobre o qual ele nunca pronunciara quaisquer palavras; ele enfatizou isso porque percebeu que tem efeitos cruciais sobre o que as massas negras pensam e fazem. Além disso, quase de passagem, ele mostrou que entendeu que apenas os negros podem levar a luta dos negros. Na última parte da sua carta, disse:

"... É de extrema importância, hoje, ter imediatamente um número de esclarecidos, jovens, negros abnegados, por menor que seja a quantidade, cheios de entusiasmo para a elevação do nível material e moral da grande massa de negros, e ao mesmo tempo mentalmente capazes de compreender a identidade de interesses e o destino das massas negras, com as das massas do mundo inteiro ...

"A educação dos propagandistas Negra é uma tarefa revolucionária extremamente urgente e importante na atual conjuntura.

"Na América do Norte a questão é ainda mais complicada pelas abominável obtusidade e de presunções de casta ​​da camada mais privilegiada da própria classe trabalhadora, que se recusam a reconhecer companheiros de trabalho e lutam contra camaradas negros. A Política do presidente da AFL Gompers 'baseia-se na exploração de tais preconceitos desprezíveis, e é na atualidade a garantia mais eficaz para a subjugação bem sucedida de trabalhadores brancos e de cor da mesma forma. A luta contra esta política deve ser retomada a partir de lados diferentes, e conduzida em várias linhas. Um dos ramos mais importantes deste conflito consiste em iluminar a consciência proletária, despertando o sentimento de dignidade humana e de protesto revolucionário, entre os escravos negros do capitalismo americano. Como dito acima, este trabalho só pode ser realizada por abnegados e politicamente educados negros revolucionários.

"É equivocado dizer que o trabalho não pode ser exercido em espírito de chauvinismo Negro, que seria então, apenas formar uma contrapartida de chauvinismo branco - mas em um espírito de solidariedade de todos os explorados sem consideração de cor.

"É difícil para mim dizer as formas de organização que são mais adequados para o movimento entre os negros norte-americanos, a partir do que sei sobre as condições concretas e possibilidades. Mas as formas de organização serão encontradas, assim que houver vontade suficiente para a ação. "

Em 1928, o Partido Comunista americano expulsou os futuros fundadores do Partido Socialista dos Trabalhadores como "trotskistas". Em 1929, eles realizaram a sua primeira conferência nacional como a Liga Comunista da América (Oposição de Esquerda). Trotsky, então exilado na Turquia pela burocracia stalinista, fez contato com seus colaboradores americanos pouco antes desta conferência e os enviou sua primeira carta, impressa em The Militant de 1º de maio de 1929, sob o título "Tarefas da Oposição americana." Ele não tinha muitas coisas urgentes para nos aconselhar,, mas não deixou de incluir uma advertência sobre a necessidade de resistir a "preconceitos aristocráticos" e encontrar um caminho para os setores mais explorados da sociedade ", começando com o Negro":

"Os burocratas sindicais, assim como os burocratas do falso comunismo, vivem na atmosfera de preconceitos aristocráticos das camadas superiores dos trabalhadores. Será uma tragédia se os oposicionistas se infectarem, mesmo no menor grau, com essas qualidades. Não só devemos rejeitar e condenar esses preconceitos; devemos queimá-los fora da nossa consciência até o último vestígio. Temos encontrar o caminho para os mais desfavorecidos, aos estratos mais escuros do proletariado, começando com o Negro, que a sociedade capitalista converteu em um pária, e que deve aprender a ver em nós seus irmãos revolucionários. E isso depende inteiramente nossa energia e dedicação ao trabalho. "

Em 1932, ocorreu um episodio que às vezes é lembrado pela distinção feita por Trotsky entre intelectuais e trabalhadores, mas também é bom lembra que ele expressou sua percepção aguçada da posição especial, não-opressiva e potencialmente revolucionário de trabalhadores negros na sociedade capitalista. A carta tinha sido escrita a partir de 24 sul-africanos negros ("e outros"), fazendo perguntas sobre o programa da Oposição de Esquerda, e candidatos à adesão. Trotsky escreveu um artigo sobre isso, que apareceu em The Militant de 2 de Julho de 1932, sob o título "Mais perto dos Proletários de cor!" Em uma parte, ele escreveu:

"Se os camaradas de Joanesburgo ainda não têm a possibilidade de familiarizar-se de forma mais estreita com os pontos de vista da Oposição de Esquerda em todas as questões mais importantes, isso não pode ser um obstáculo no dialogo com eles, tanto quanto possível, mesmo hoje e para ajudá-los fraternalmente a entrar em órbita do nosso programa e nossas táticas.

"Quando dez intelectuais de Paris, Berlim ou Nova York, que estiveram em várias organizações, dirigir-se a nós com um pedido para ser levado ao nosso meio, gostaria de dar o seguinte conselho: Coloque-os através de uma série de testes sobre todas as questões de programa; molhe-os sob a chuva, seque-os ao sol e, em seguida, após um novo exame cuidadoso, aceite um ou dois.

"O assunto muda, basicamente, quando dez trabalhadores ligados com as massas vêm até nós. A diferença em nossa relação com o pequeno-burgues e aos grupos proletários não requer nenhuma explicação. Mas se o grupo proletário trabalha em um distrito onde há trabalhadores de várias raças, e apesar disto, consiste apenas de trabalhadores de nacionalidade privilegiada, estou inclinado a considerá-los com desconfiança: Será que não estamos lidando com os trabalhadores ou aristocratas? Não é um grupo envenenado por preconceitos escravista de forma ativa ou passiva?

"É uma questão bem diferente quando somos abordados por um grupo de trabalhadores negros. Aqui eu estou pronto a considerar de antemão que estamos a chegar a um acordo com eles, mesmo que este ainda não seja óbvio; por causa de sua posição geral, eles não se esforçam e não podem se esforçar para degradar qualquer pessoa, oprimir ninguém ou privar qualquer um de seus direitos. Eles não buscam privilégios e não pode subir ao topo, exceto na estrada da revolução internacional.

"Nós podemos e devemos encontrar um caminho para a consciência dos trabalhadores negros, dos trabalhadores chineses, dos trabalhadores hindus, todas essas raças de cor oprimidas do oceano humano a quem pertence a palavra decisiva no desenvolvimento da humanidade".

Durante seus primeiros cinco anos, a Liga Comunista da América se considerava e funcionou como uma fração do Partido Comunista. Isto é, embora seus membros tenham sido expulsos do PC, o seu objetivo era reformar o PC - pressionar a mudar suas políticas erradas e readmitir os membros do CLA. Suas atividades foram em grande parte determinadas, definidas e limitadas por este objetivo. Na luta Negra as diferenças entre as duas organizações eram principalmente sobre questões táticas, e não figurava com destaque no programa do CLA ou na sua literatura.

No final deste período, no início de 1933, um líder CLA, Arne Swabeck, durante viagem no exterior, manteve discussões com Trotsky em Prinkipo, Turquia. Uma dessas discussões, realizadas em 28 de fevereiro de 1933, dizia respeito à luta dos negros. O texto apareceu no boletim interno CLA sob o título, "A Questão Negra na América." Não foi relatado que a transcrição foi em" forma de sumário, " o que significa que ele não foi corrigida pelos participantes e, portanto, pode não ser totalmente precisa em cada formulação. Com esse aviso será reproduzida aqui depois de algumas melhorias na pontuação e ortografia.

O que essa discussão mostra, em ambos os lados, é uma preocupação séria sobre a questão do negro, acoplada a uma falta de conhecimento sobre muitos de seus aspectos importantes. Reflete um estágio anterior no pensamento e desenvolvimento do movimento americano - antes dele ter". Ainda formulado um programa" Ele também expressa muito fortemente o pensamento de Trotsky sobre as questões de "auto-determinação", derivada, como ele próprio assinalou, não de um estudo das condições nos Estados Unidos, mas a partir de "considerações gerais". (Estas considerações são desenvolvidos mais detalhadamente no "O Problema das Nacionalidades," um capítulo na história da Revolução Russa, Vol. 3.) Uma coisa é certa: muitos dos argumentos que aparecem na discussão de 1933 ainda são pertinentes em 1960; em alguns aspectos, mais pertinentes agora.

Após uma avaliação da forma como a Internacional Comunista estalinizada tinha traído a luta contra os nazistas na Alemanha, a Oposição de Esquerda em 1933 abandonou a ideia de reformar os partidos comunistas, e proclamou a necessidade de construir um novo partido marxista revolucionário internacional de todo o mundo. Como parte do trabalho de reunir as forças para de novo partido neste país, o CLA se distanciou do Partido Comunista e sua periferia e caminhou na direção dos movimentos de massas e lutas dos trabalhadores e dos seus aliados. Até o momento, o Partido Socialista dos Trabalhadores foi fundado em 1938, alguns ramos foram capazes de denunciar o início da promoção da contratação de negros tanto do movimento de desempregados quanto nas plantas.

Mas o giro não veio no ano seguinte, em seguida, ele veio por duas razões. As atividades práticas do partido entre os trabalhadores negros no trabalho e movimentos de desempregados tinha estimulado o desejo de clarificação teórica sobre a natureza e a direção da luta dos negros e tinha produzido uma demanda por uma maior atenção para a luta no programa e literatura do partido. Ao mesmo tempo, felizmente, o interesse do partido e a atividade neste campo tem um ímpeto saudável vindo de "fora" -  um membro não-americano da Quarta Internacional (que se filiou ao SWP) , JR Johnson. Um intelectual revolucionário, Johnson teve uma compreensão fundamentalmente sobre da luta dos negros e fez muito para ajudar os outros a entender e integra-la. Infelizmente, Johnson também foi politicamente instável; ele deixou o partido na divisão Shachtman-Burnham de 1940, retornou em 1947 e novamente foi à esquerda em 1951. Mas ninguém pode negar as valiosas contribuições que ele fez para a teoria do partido e no trabalho da luta Negra. (Johnson figura nas seções subseqüentes desta coleção sob os pseudônimos de "George" e "J. Meyer.")

Em preparação para uma convenção SWP que seria realizada em meados de 1939, Johnson fez uma visita a Trotsky, no México, onde apresentou algumas notas preliminares para servir de base para três debates realizados em 4, 5 e 11 de abril. Os assuntos que eles discutiram foram auto-determinação; a possibilidade de colaborar com outras forças na criação de uma organização independente de ação Negra; e o programa e planos para tal organização. As transcrições foram submetidas à SWP para discussão antes da convenção nacional que se aproximava. Eles foram reimpressos aqui como apareceram na Quarta Internacional, em maio de 1948; De setembro de 1948; e fevereiro de 1949. (Mais uma vez a nota de um estenógrafo explica que eles são um "rascunho não corrigida pelos participantes").

A convenção SWP se reuniu em Nova Iorque 01-04 julho de 1939. Comentando editorialmente 07 de julho, The Militant disse: "Não há dúvida de que a sessão (na luta dos negros) marcou a etapa mais importante, não só na convenção, mas na história do partido. "Também não há dúvida de que os delegados levaram a sério e concordaram com o aviso de Trotsky sobre o que a continuidade da negligência da luta dos negros significaria para o próprio partido. Isto foi claramente expresso na maior resolução aprovada nesta sessão: "O SWP deve reconhecer que sua atitude para com a questão negra é crucial para o seu desenvolvimento futuro. Até agora o partido tem sido baseado principalmente sobre os trabalhadores privilegiados e grupos de intelectuais isolados. A menos que ele possa encontrar seu caminho para as grandes massas dos desprivilegiados, dos quais os negros constituem tão importante parcela, a ampla perspectiva da revolução permanente permanecerá apenas uma ficção e o partido será obrigado a se degenerar ".

A convenção elegeu um comitê de 12 pessoas para elaborar resoluções e recomendações. A Comissão de Trabalho Negro trouxe um programa de ação que a convenção enviou à Comissão Nacional para a implementação. Também trouxe uma resolução, "O SWP e Trabalho Negro" lidando com a necessidade de educar ainda mais o partido, os planos para o recrutamento de negros politicamente avançados, e a prontidão do partido para ajudar a criar uma nova organização militante Negra. Esta resolução foi aprovada sem oposição e é reproduzida aqui. (Foi acordo geral após a convenção, pelos membros da Comissão do Trabalho Negro e do partido que um "exagero" tinham aparecido no segundo período, em vez de dizer o seu passado histórico designou negros norte-americanos a ser "a própria vanguarda da revolução proletária", deve ler-se "na própria vanguarda da revolução proletária.")

Uma outra resolução - sobre a autodeterminação - resultou em diferenças na Comissão do Trabalho Negro. Um relatório da maioria da comissão foi apresentado à convenção por Johnson, em seguida, Mc Kinney e Wright estavam cada vez determinado a apresentar os seus relatórios minoritários. As suas diferenças podem ser percebidas a partir das alterações por elas oferecidos a resolução sobre a auto-determinação: as alterações do Mc Kinney foram para eliminar o quinto parágrafo e a quinta, sexta e sétima frases do último parágrafo. Alterações de Wright tirar além da parte de "uma parte que trata da relação dos proletários negros para os negros como um todo de abertura. Caso a massa decisiva dos trabalhadores negros sejam ganhos para a Quarta Internacional, que têm uma influência decisiva sobre a questão", e depois disso a terceira frase do quinto parágrafo de" uma seção lidar com possíveis efeitos do desenvolvimento de "contra- crise revolucionário "sobre os negros. Sugestão de formulação: 'Ne se pode excluir que, em uma crise contra-revolucionária o desejo de um Estado Negro pode assumir um caráter mais reacionário do que o movimento de Garvey. "

Três propostas foram apresentadas sobre a questão da autodeterminação:

Movimento por McKinney: "A convenção recomenda ao Comitê Nacional de entrada a uma resolução política geral sobre o negro em os EUA ser preparado, uma seção do que a resolução de lidar com a questão da auto-determinação. Resolução a ser adotada pelo partido referendo dentro de um prazo de sessenta dias após a apresentação para a partido. "(Derrotado por ação sobre os movimentos subsequentes.)

Movimento por Wright: "Resolução sobre a autodeterminação deve ser adotada como base para um projeto final. Todas as alterações a que se refere ao trabalho realizado ".


Movimento pela Comissão do trabalho Negro: "A Comissão de Trabalho Negro recomenda à convenção nacional que instrua o trabalho de entrada para preparar o mais rapidamente possível uma resolução geral sobre o problema do negro na América. Esta resolução deve lidar com a questão como um todo, em todos os seus aspectos e, do ponto de vista mais amplo, deve servir como documento de base do partido sobre a questão. Essa resolução só vai jogar na perspectiva correta e reduzir as suas proporções adequadas o único aspecto do problema representado pelo direito à auto-determinação. A convenção deve aportar mais para o trabalho inicial que, após a conclusão desta resolução geral, deve tomar medidas imediatas para instituir discussão sobre isso no partido a fim de que o partido adote um documento tão básica, tão rapidamente quanto possível. "

quarta-feira, 8 de março de 2017

Por um Feminismo Negro e Operário!



Desde o chamado para a greve internacional de mulheres, tenho me perguntado o porque do meu distanciamento com o movimento feminista. Ao reler “Mulheres, Raça e Classe” de Angela Davis me deparei com várias questões que já havia levantado para companheiras do movimento feminista, do movimento negro e de organizações de esquerda, assim como inquietações pessoas que me distanciavam de várias lutas. A partir da discussão que Angela levanta, decidi escrever não sobre o meu distanciamento do movimento feminista, mas sobre o distanciamento desse movimento de mulheres como eu, em diálogo com uma das mulheres que convocou essa greve, Angela Davis.

A questão central que esse livro evoca – e já aparece em seu próprio título – é como as questões de gênero, raça e classe se colocam na prática como elementos indissociáveis em nossa sociedade. Em outras palavras, analisar qualquer um desses elementos como algo dissociado dos outros se torna impossível, visto que cada um deles serve como aprofundador dos outros. Ou seja, falar sobre mulher sem discutir a realidades das mulheres trabalhadoras, negras, trans e etc. restringe o olhar do gênero, e mais do que isso impossibilita a luta pela emancipação de todas as mulheres.

O feminismo, não só na história dos EUA, mas por todo o mundo, incluindo o Brasil, se demonstrou muitas vezes racista e elitista, assim como transfóbico, bifóbico e homofóbico. Fruto disso é que ainda hoje carregamos em nossas pautas rastros dessas posturas. Será que quando pensamos e elaboramos um programa de luta das mulheres levamos em conta nossas diferenças e quais são as necessidades das companheiras marginalizadas por essa imensa trama de opressão?

Um dos exemplos colocados por Angela Davis em seu livro é a luta pelo direito ao aborto e como isso se expressava nas vidas das mulheres trabalhadoras, negras e latinas. Gostaria de me debruçar sobre ele, para que possamos nos perguntar, será que não estamos cometendo erro semelhante?

Os grupos de mulheres que se organizaram e lutaram pelos direitos reprodutivos, infelizmente, não se deram conta (ou simplesmente não quiseram pensar sobre isso) da necessidade de se unir ao conjunto das mulheres e entender as diferentes realidades ao levantar a necessidade do direito ao próprio corpo e à maternidade ou não. Essa luta, da forma com que foi levada, acabou se misturando à defesa da supremacia branca, possibilitando a esterilização involuntária de milhares de mulheres, que segundo a sociedade não estavam aptas a terem filhos.

Por muitas vezes tenho me deparado com problemas como esses na nossa luta pelo direito ao aborto. O direito ao aborto é uma pauta que diz respeito a todas as mulheres, mas também é verdade que muitas das mulheres trabalhadoras, negras e pobres sequer têm o direito à maternidade, seja por esterilização involuntária (que também já aconteceu em nosso país), pela falta de pré-natal, creches e auxilio do Estado para conseguir cuidar de seus filhos. Afinal o cuidado com as crianças não deveria ser um dever das mulheres, mas sim uma obrigação social.

Poderíamos gastar páginas e mais páginas para demostrar o rol de pautas que acabam silenciando necessidades profundas da maior parte das mulheres, ou mesmo a falta das demandas desses setores em nosso movimento, como é o caso da exigência de restaurantes e lavanderias públicas, da luta contra a hipérsexualidazão das mulheres negras, por igual salário e igual trabalho, educação, pelo fim das mortes e estupros LGBTfóbicos e etc. A questão é que por muitas vezes nos afastamos do movimento feminista porque esse não fala sobre a nossa vida, nossas demandas e isso de nenhuma forma significa que nós não queremos acabar com a opressão de gênero.

O chamado das companheiras para uma greve internacional de mulheres tem em seu conteúdo uma tentativa de falar em nome da maioria das mulheres. Usa a greve como ferramenta de reinvindicação, pois se trata de uma poderosa ferramenta da classe trabalhadora. Mas vaia além disso, levanta a questão das milhares de mulheres imigrantes que fogem dos seus países atacados pelo imperialismo e são brutalmente oprimidas em outros países, das mulheres negras, trabalhadoras e LBT´s. E o mais importante, na minha análise é que essas mulheres decidiram negar o feminismo elitista e liberal, que só serve para uma minoria de mulheres, burguesas e ricas que são responsáveis pela opressão e exploração de muitas de nós.

A questão que gostaria de levantar nesse primeiro texto de reflexão é, não é possível liberdade enquanto uma de nós continue vivendo na exploração e opressão. O feminismo só pode realmente triunfar junto ao conjunto dos oprimidos e oprimidas, esse deve ser nosso caminho.


Vivemos num sistema onde a maior parte da população é obrigada a vender sua força de trabalho- ou seja, sua vitalidade – para conseguir sobreviver, enquanto uma minoria vive de luxo roubando parte da riqueza produzida pelo nosso trabalho. Nesse sistema a dominação das mulheres é crucial para garantir a reprodução por um lado da classe trabalhadora, mas por outro lado também da propriedade privada, assim como é necessário perpetuar o racismo como ferramenta que possibilite colocar um setor da população trabalhadora como cidadãos de segunda classe aumentando ainda mais o índice de exploração.

Essas divisões, que não foram criadas por nós, impossibilitam nossa unidade contra nossos verdadeiros inimigos. Gostaria de deixar bem claro que, assim como já dizia C.L.R James, essa divisão ainda se perpetua no seio de nossa classe não por culpa das mulheres, dos LGBT´s, dos negros, mas por conta dos setores que reproduzem essa opressão fazendo com que nós não nos sintamos parte da luta, afastando os setores mais oprimidos como forma de manter um vínculo hierárquico de “sócio menor” da classe que oprime.


O desafio está posto, a história nos mostra que é preciso que construamos um outro feminismo, que se ligue a classe trabalhadora e que seja o porta voz das necessidades das mulheres mais oprimidas de nossa sociedade contra a classe que nos oprime e que faz questão de manter a opressão para nos explorar. Façamos desse 8 de março um recomeço de uma luta de real emancipação de todas as mulheres.

SOMOS MUITAS, SOMOS FORTES, E JUNTAS CONSEGUIREMOS VENCER AS AMARRAS DA OPRESSÃO MACHISTA!

segunda-feira, 7 de novembro de 2016

Escritos sobre a Dialética radical do Brasil Negro – Clóvis Moura. PARTE 3

Escritos sobre a Dialética radical do Brasil Negro – Clóvis Moura.
Cap. IV: Especificidades e dinamismo dos movimentos de São Paulo:
O problema eleitoral e o movimento negro (302).




O movimento negro que se articulou durante a ditadura militar acabou por se fragmentar a partir do processo de redemocratização lenta e gradual deste regime para a “democracia” burguesa. As diferenças políticas e ideológicas que já existiam dentro do movimento, levaram neste momento pessoas e grupos negros a procurarem diferentes partidos políticos que estavam se legalizando, nestes algumas destas personagens se tornaram candidatos eleitorais (“Cria-se uma fragmentação do grupo letrado que tem ambições político-eleitorais pessoais”. 302). Esses partidos em sua maioria não apresentavam nenhuma proposta ou programa sobre a questão racial. Um exemplo deste problema se retrata na própria história do Partido dos Trabalhadores e a luta de seus militantes negros para afirmarem as pautas raciais dentro da organização, vide o programa das candidaturas a presidência que só no ano de 2002 teve pela primeira vez uma sistematização de propostas especificas para os negros.
A dinâmica de separação destes setores do movimento negros letrado e a forma com que se dá a construção (e podemos dizer também a cooptação) das figuras políticas negras, assim como a própria dinâmica do racismo brasileiro – a partir do mito da democracia racial, da pressão para o branqueamento e a fuga da identidade étnica do negro –fez com que o negro plebeu não visse “diferença entre votar em um candidato branco ou em um negro, pois ambos os retratavam da mesma forma, isto é, como objeto de seus desejos de mobilidade social e política”. (303)
Em geral, o universo negro letrado e seus ideólogos produziram, a partir de suas condições materiais, postulados sobre a questão racial que não alcançam o universo plebeu, estes são resumidos por João Borges Pereira nos seguintes pontos:
“a) O advento de uma era para os negros;
b) a esperança de um futuro fraterno;
c) a inversão na dialética das cores;
d) a meta de integração”. (306)
Também, a partir desses pressupostos é possível perceber como o universo negro letrado não consegue ou não quer compreender a dialética da dinâmica racial e sua relação com a questão de exploração de classe, que é indissolúvel. Como já mencionamos esse é um paradigma não só desse setor, Clóvis expressa a partir das palavras de Borges: “(...) como os teóricos acadêmicos ao estudarem o negro, os partidos políticos e os próprios negros não sabem como lidar essa ambiguidade. Os partidos políticos tratam o negro ora como parte de uma nebulosa minoria carente de participação social, onde se alinham as mulheres, homossexuais, índios, etc., ora como componente desadjetivado da sociedade brasileira, nivelando desta maneira os seus eventuais problemas específicos aos problemas nacionais. E a representação do modelo multirracial brasileiro  passa para os teóricos e práticos da política, que aliás se infiltra por todos os planos da cultura nacional”. (306)
O autor aponta como conclusão de sua análise da questão racial no Brasil que só a partir de uma relação dialética de raça e classe é possível construir uma postura radical capaz de unir os dois universos negros na luta contra a opressão e a exploração, pois o problema do negro na sociedade de classes passa necessariamente pelos problemas da divisão das classes sociais pelas lutas das classes subalternas.
Como problematização do movimento negro, o autor aponta que este, por sua vez, separa os elementos raciais da questão de classe, tentando desligar a exploração econômica do negro da opressão racial que sofre, transformando (na sua análise) o racismo em sentimento inato do branco. Essa visão não dialoga/ corresponde ao universo plebeu que sofre cotidianamente com o racismo que serve de ferramenta do sistema para explorar brutalmente esse setor e negá-lo a possibilidade de ascenção.
PS: o autor coloca nesta parte que especificamente em São Paulo “o modelo de capitalismo desenvolveu-se completamente” (309). Fico em dúvida se essa afirmação pode se interpretada como um rastro de uma visão estalinista de desenvolvimento etapista (fruto dos anos de militância no PCB), ou se é um apontamento sobre o local específico do qual se refere neste capítulo. 

terça-feira, 25 de outubro de 2016

As Tarifas Têm que Cair: Nota da Luta dos Estudantes da África do Sul




As Tarifas Têm que Cair, resposta à declaração do NSFAS em 2016 Alocação de Fundos e Implementação, 26 de janeiro de 2016.

O plano de correção financeira na África do Sul post-94 (tal como a BEE, NSFAS e garantias sociais) serve para favorecer a agenda neoliberal capitalista do nosso governo. Nós estamos aguardando para resgatar nossa liberdade daqueles que ganharam com a nossa subjugação com dinheiro que nós não temos mais.

O Planos Nacional de Auxílio Financeiro Estudantil (NSFAS) proveu empréstimos para estudantes universitários qualificados academicamente, sob especificações de um “questionário socioeconômico”. Essas funções dento de um sistema no qual instituições governamentais provem auxilio para os “mais pobres dos pobres”, mas ao fazê-lo, coloca a responsabilidade sobre o indivíduo para pagar os serviços que, de qualquer maneira, deveriam ser prestados gratuitamente pelo governo.

O Plano da NSFAS pode ser comparado com um sistema em que questões
Governamentais são garantidas de modo que os destinatários têm de pagar pelo equipamento “publico”, como cuidado à saúde, educação. Uma vez que essa garantia é paga pelo destinatário, torna-se a responsabilidade do indivíduo para poder usufruir disto em sua capacidade particular. Desse modo, dinheiro “privado” começa a ser usado para pagar pelo que deveria ser serviço público, diminuindo a responsabilidade governamental de assegurar que essas instituições sejam funcionais e acessíveis a todos. A privatização do fundo “público” acontece através do modelo do NSFAS, no qual os estudantes pobres são individualmente responsáveis por pagar de volta seus empréstimos estudantis. Um sistema no qual as pessoas que são financeiramente aptas paguem coletivamente pelos que não podem pagar essas taxas seria certamente a estrutura mais sustentável, uma vez que esse progresso significa a redistribuição do poder e riqueza nesse país.

Como parte das negociações da “Equipe de Terceirização de Serviço” na “Wits University”, o salário mínimo base para os trabalhadores da universidade deve ser fixado numa média de R45000 a R5000 por mês. Na recente declaração, o NSFAS exigiu que os estudantes graduados que recebem cerca de R30 000 por anos (ou R2500 por mês) comecem a pagar seus empréstimos. Os graduados devem começar a pagar 3% do seu salário anual, a partir de R30 000. Isso aumenta para no máximo 8% quando seu salário alcança R59 300 (+/- RS4940 por mês) ou mais por ano. Por exemplo, isso significa que você vai pagar R900 por ano com um salário de R30 000 por ano, ou R75 por mês. Uma vez que seu salário anual é de R59 300 você vai pagar R4 744 por ano ou R395 por mês.

Os juros dos empréstimos são cobrados 12 meses depois de você ter completado seus estudos por ter se graduado ou caído fora. Com juros isso chega à 80% da taxa de reposição, que é a porcentagem da taxa readquirida pelo Banco de Reversa, que empresta para bancos comerciais, NSFAS continua a cobrar juros de todos os saldos pendentes. Vemos aqui como o plano de reembolso é paralisante para graduados que, se são capazes de conseguir um emprego será apoiando uma rede de família ampliada. Quando a própria universidade estabelece um salário mínimo vital de R4500-R500 para seus trabalhadores, como se pode esperar que seus graduados paguem seus empréstimos, com juros, tendo um salário de RS2500 por mês?

Além disso, estudantes graduados que não conseguem paras suas dívidas com o NSFAS podem enfrentar consequências legais graves, “News 24” relatou em 21 de janeiro que o presidente do esquema Sizwe Nxasana não iria discutir os passos específicos do plano que foi tomado em termos de coletar dividas, dizendo: “ Nós vamos seguir o processo normal determinado pela Lei Nacional de Crédito”.

O atual regime do neoliberalismo dita aquilo que o sistema educacional por sua vez tem como objetivo para instituições de ensino superior de acordo com imperativos econômicos, ao invés de usar a educação como uma ferramenta para autodesenvolvimento e empoderamento. Isso pode ser visto nas universidades da África do Sul. Onde há um crescimento no número de estudantes que se inscrevem em cursos de engenharia porque esse setor tem sido identificado pelo governo como desejável-rentável para seu crescimento, sendo liderança para avaliação de mais fundos para estudantes nesse departamento. Isso se desenrola frente à um plano de fundo de disseminação de perda de emprego disseminado na mineração, siderurgia e metalurgia.

A declaração de 21 de janeiro do NSFAS detalha os bilhões de Rands que estão sendo despejados para o fundo. Nós acreditamos que injetar mais dinheiro nesse plano não é a solução. O diagnóstico governamental equivocado da crise na educação superior e sua recusa de rever as políticas postas em prática de perpetuação da pobreza e não expressa questões socioeconômicas e as desigualdades no nosso país.

Um artigo na primeira página do “Sunday Times” em 17 de janeiro de 2016 anuncio uma chamada para doação para o que o Wits SRC tem chamado de “ o meio perdido”. Esses são estudantes os quais o SRC, no seu plano de 18 de janeiro chama dos que são “muito pobres para serem ricos e muito ricos para serem pobres”. Isso significa de acordo com a atual ferramenta de teste da NSFAS que eles não estão qualificados para o financiamento, nem eles nem seus familiares tem dinheiro suficiente para manda-los para a universidade de forma independente. A declaração do comitê do NSFAS comprometeu-se a alterar as diretrizes dessa ferramenta de teste para incluir esse grupo em 2017 e 2018.

O chamado para doação tem o objetivo de aumentar R10 milhões no serviço de avaliação de empréstimo estudantil para os “meio perdidos”. Como muitos outros programas de caridades e de auxilio, a captação de recursos não aborda que os sistemas que devem ser derrubados no interesse de reestruturar o financiamento estatal das Universidades de modo a providenciar educação gratuita e de qualidade para todos.

O movimento “The Wits Fees Must Fall” (As Tarifas Têm que Cair), portanto, rejeita qualquer tipo de ajuste e novas resoluções feito pela apreciação governamental da NSFAS, porque não aborda a raiz dos problemas. Nós vamos continuar a, inequivocamente e eloquentemente chamar por uma EDUCAÇÃO LIVRE em sua totalidade e continuar a expor o sistema atual falho que não cura as nossas feridas de fome, mas coloca um curativo nessas feridas, criando uma ilusão que perdura há muito tempo.


ALUTA CONTINUA!





traduzido de: https://www.facebook.com/FeesMustFallJoburg/posts/774418429357626

quinta-feira, 13 de outubro de 2016

Escritos sobre a Dialética radical do Brasil Negro – Clóvis Moura. PARTE 2

Escritos sobre a Dialética radical do Brasil Negro – Clóvis Moura.
Cap. IV: Especificidades e dinamismo dos movimentos de São Paulo:
Dois universos negros e sua dinâmica divergente em São Paulo (p.290)





                      Clóvis divide o universo negro em dois níveis: 1) plebeu, composto pelos negros pobres, com pouca ou nenhuma escolaridade, que vivem em empregos mal remunerados ou desempregados; 2) letrado, a classe média nega que ascende por meio de cargos burocráticos, pelo crescimento econômico, pela arte, esporte ou academia. Esses dois grupos apresentam diferenças de comportamento e ideologias divergentes (mesmo que possuam alguns elementos em comum), fruto de suas diferentes condições materiais.
                      As propostas sobre a questão racial no Brasil, geralmente elaboradas por setores do universo negro letrado não saúdam as problemáticas vividas pelo negro plebeu. Este, apesar de ser reconhecido como parte do problema racial, não é visto como força política capaz de resolver as contradições sociais e raciais devido a sua posição na estrutura do país, mas é visto como instrumento (objeto) no qual o universo letrado deve atuar (contraditoriamente veremos que é esse lugar social que o negro plebeu ocupa que o torna setor altamente explosivo e potencialmente radical, fora é claro, o fato de que esse universo compõe um numeroso setor da classe trabalhadora do país). Esses dois universos quase nunca se cruzam na práxis política, principalmente no que diz respeito a questão racial. Alguns grupos negros se voltam para o universo plebeu, mas geralmente, a partir de uma visão assistencialista e não de fusão política e ideológica.
                      A divisão entre estes universos se evidencia nos processos eleitorais, onde figuras negras (normalmente oriundas de setores letrados) se deparam com a contradição entre os anseios do universo letrado e as reivindicações do universo plebeu. Então, nesse sentido se igualam aos padrões brancos de buscar por resultados individuais ou de seus grupos, deixando para trás as questões importantes para o universo plebeu.
                      Nesse momento – eleitoral – “apelar” pela ligação racial dos dois universos não pode causar grandes resultados visto que essa ligação (ou tentativa de) é circunstancial. Então, o universo negro plebeu, que também é manipulado e disputado pelos políticos brancos nega a lógica que a classe média negra tenta levantar de que “negro vota em negro”. A partir de análise de processos eleitorais anteriores o autor comprova que na realidade negro não vota em negro em sua maioria.
                      As ideologias produzidas e circuladas nas camadas negras letradas vão da mais profunda incorporação de valores capitalistas e brancos à radicalidade anti-sistemica e antirracista. Dentre as organizações negras atuais, segundo o autor, o Movimento Negro Unificado (MNU) é quem “(...) apresenta a proposta mais radiacal em termos de mudança social, isto é, de dinamização da nossa estrutura, incluindo e enfatizando ou produzindo as modificações radicais nas relações raciais e sociais”. (297)
                      O MNU foi na história a segunda grande organização do movimento negro pós-abolição (sendo a primeira a Frente Negra Brasileira na década de 1930). Apesar de ter importante papel na organização e radicalização dos negros e suas pautas, não foi capaz de levar a luta antirracista até suas ultimas consequências por diversos fatores, dentre eles tem peso importante os erros políticos históricos da esquerda de conjunto que devem ser encarados de forma dura, merecendo profundo balanço por não ter conseguido analisar a questão racial no Brasil e sua importância para o processo de revolução, sendo incapaz de levantar junto ao movimento negro uma luta de massas de raça e classe. Outro fator diz respeito aos limites impostos pela própria ideologia e programa do MNU.
                      O MNU foi parte e sujeito de um processo de reorganização do movimento negro, esse processo aumentou o nível de consciência crítica radical do negro paulistano e se expandiu em território nacional. Esse processo se inicia em meio à ditadura militar, num ambiente de efervescência de articulações entre os negros, essa tem como base, possivelmente, a necessidade de responder ao aprofundamento de diversos mecanismos racistas, principalmente vindo do Estado e de seus representantes em diversos níveis.
                      Se, por um lado a ditadura aprofunda a divisão entre os dois universos negros permitindo que setores do universo letrado se beneficiassem do “milagre econômico” enquanto o universo plebeu se encontrava em aprofundamento de suas já péssimas condições. A influência do movimento negro radical norte-americano da década de 1960 possibilitou a radicalização das posições de diversos setores do universo negro letrado, assim como os processos de independência de países africanos, especialmente os de língua portuguesa.
                      O universo negro plebeu neste período se encontrava majoritariamente organizado em entidades de cultura popular que foram alvos de forte trabalho de cooptação, assim como de uma grande assimilação de padrões culturais brancos.
                      A influência do universo letrado no universo negro plebeu acabo por construir uma hierarquização entre esses dois universos onde os negros letrados se comportavam como cabeça pensante e direção do conjunto dos negros. “Esta postura hierarquizante talvez tenha influído para que os negros do universo não letrado se refugiassem ou se reordenassem em organizações, grupos ou segmentos de reivindicações populares nos quais o problema racial e as consequentes posturas de reivindicação étnica não fossem colocadas em primeiro plano, mas de salários, habitação, educação, segurança e transportes – objetivos que sendo sociais e econômicos são, por força do peneiramento imposto ao negro, também raciais, mas, para eles, não são assim diretamente traduzidos”. (301-302)
                      A partir do que foi exposto, a questão que gostaria de levantar é como tanto o movimento negro, quanto os movimentos sociais populares acabam, cada qual ao seu modo se adaptando à ideologia da democracia racial, impossibilitando uma visão profunda e dialética entre raça e classe levantando uma práxis radicalizada de transformação da realidade social e racial (em vista que essas têm uma relação indissolúvel).
                      Se por um lados os movimentos sociais diluem a questão negra nas pautas sociais, sem levantar suas especificidades, por outro o movimento negro ao tentar fortalecer/afirmar a sua luta antirracista, nega por diversas vezes questões socioeconômicas que dizem respeito ao conjunto dos setores oprimidos, sem perceber que estas são sentidas de maneira mais dura e profunda pelos setores do universo negro plebeu.

                      Essas contradições colocam os negros (principalmente do universo plebeu) no dilema de ter de “optar” entre se juntar à luta de um desses dois setores que na realidade são incapazes de dar uma resposta radical, e por isto definitiva, aos seus problemas. Ainda assim, segundo apontamentos do autor, para o universo negros plebeu as questões materiais de vida acabam, na maioria dos casos, falando mais alto por uma questão óbvia de sobrevivência.